O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional. Terceira Seção, aprovada em 25/3/2015, DJe 6/4/2015.
A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública. Terceira Seção, aprovada em 25/3/2015, DJe 6/4/2015.
A conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa. Terceira Seção, aprovada em 25/3/2015, DJe 6/4/2015.
O reajuste de 28,86% sobre a Gratificação de Estímulo à Fiscalização e Arrecadação - GEFA incide, após a edição da MP 831/1995 até a edição da MP 1.915-1/1999, mais precisamente, no período de janeiro de 1995 a julho de 1999. A despeito de ser firme o entendimento do STJ no sentido de não incidir o reajuste de 28,86% sobre a GEFA, porque essa gratificação seria calculada com base no vencimento básico do respectivo servidor, sob pena de bis in idem, observa-se que esse entendimento não se aplica indistintamente durante todo o período em que vigorou a referida vantagem. Nessa linha intelectiva, analisando-se os reajustes concedidos pelas Leis 8.460/1992, 8.622/1993 e 8.627/1993, não há como se confundir o pagamento do reajuste de 28,86% sobre o vencimento básico do Auditor Fiscal (o que é compensável pelo reposicionamento) com o pagamento do mesmo reajuste sobre a GEFA, cuja base de cálculo é o padrão A-III multiplicado por oito, no período de janeiro de 1995 a julho de 1999. Assim, os reajustes concedidos pelas Leis 8.622/1993 e 8.627/1993 não justificam compensação, à luz do entendimento do STF no RMS 22.307-DF e da Súmula 672 do STF. Portanto, não restam dúvidas acerca da incidência do reajuste de 28,86% sobre GEFA a partir da edição da MP 831/1995, quando houve a modificação da base de cálculo da referida gratificação, uma vez que o aumento salarial concedido aos servidores pela Lei 8.627/1993, a despeito do reposicionamento em três padrões de vencimento (art. 3°, II), não é compensável com o reajuste de 28,86%, posto tratar-se de aumentos distintos, um decorrente de reposicionamento e o outro de revisão geral de vencimentos, conforme firmado pelo Pretório Excelso. Por fim, com a edição da MP 1.915, de 30/7/1999, houve reestruturação da carreira de Auditoria do Tesouro Nacional, alterando a nomenclatura para “Carreira Auditoria da Receita Federal”, além de dispor, em seu art. 14, que “os integrantes da Carreira da Auditoria-Fiscal da Previdência Social e da Carreira Fiscalização do Trabalho não fazem jus à percepção da Gratificação de Estímulo à Fiscalização e Arrecadação - GEFA, criada pelo Decreto-Lei nº 2.371, de 18 de novembro de 1987”, que foi substituída pela Gratificação de Desempenho de Atividade Tributária – GDAT (art. 7º), calculada no percentual de até cinquenta por cento, incidente sobre o vencimento básico do servidor. REsp 1.478.439-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 25/3/2015, DJe 27/3/2015.
Nos contratos de mútuo e financiamento, o devedor não possui interesse de agir para a ação de prestação de contas. A ação de prestação de contas constitui procedimento especial de jurisdição contenciosa normatizado nos arts. 914 a 919 do CPC e presta-se, essencialmente, a dirimir incertezas surgidas a partir da administração de bens, negócios e interesses alheios, cabendo ao gestor a apresentação minuciosa de todas as receitas e despesas envolvidas na relação jurídica e, ao final, a exibição do saldo, que tanto pode ser credor quanto devedor. O art. 914 do CPC dispõe que a “ação de prestação de contas competirá a quem tiver: I - o direito de exigi-las; II - a obrigação de prestá-las”. A hipótese a que se refere o inciso I – única que interessa ao presente caso – visa a permitir que o autor exija do réu o oferecimento de contas. Fundamenta-se exclusivamente na existência ou não do direito de exigir essas contas, sem que seja necessário que se invoque alguma desconfiança sobre o trabalho exercido pelo administrador ou algum saldo supostamente existente em razão da atuação deste. Assim, na ação de prestação de contas, é fundamental a existência, entre autor e réu, de relação jurídica de direito material em que um deles administre bens, direitos ou interesses alheios. Sem essa relação, inexiste o dever de prestar contas. Nessa ordem de ideias, são duas conclusões acerca do interesse de agir nesse tipo de ação: a) o interesse sobre o qual versa a prestação de contas independe da existência ou não de débito e b) requer apenas a existência de vínculo jurídico capaz de obrigar uma das partes a prestá-las em favor da outra. No contrato de mútuo bancário, a obrigação do mutuante cessa com a entrega da coisa. Nesse contexto, não há obrigação da instituição financeira em prestar contas, porquanto a relação estabelecida com o mutuário não é de administração ou gestão de bens alheios, sendo apenas um empréstimo. Conclui-se, então, pela inexistência de interesse de agir do cliente/mutuário para propor ação de prestação de contas, haja vista que o mutuante/instituição financeira exime-se de compromissos com a entrega da coisa. Ou seja, “a atividade da instituição financeira limita-se a entrega de recursos ao tomador do empréstimo, no valor estipulado contratualmente, cabendo a este a restituição da quantia emprestada, na forma pactuada”. (REsp 1.225.252-PR, Terceira Turma, DJe 6/5/2013). No que concerne à matéria, a Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.201.662-PR, firmou o entendimento de que, na hipótese de contrato de financiamento, não há, para o tomador do financiamento, interesse de agir na propositura de ação de prestação de contas, uma vez que o banco não administra recursos do financiado. Ademais, importante salientar que a questão analisada é diversa da regulada na Súmula 259 do STJ, que dispõe sobre o cabimento da ação de prestação de contas em contratos de conta-corrente bancária. Aliás, toda argumentação utilizada até aqui deve ser estendida aos contratos de financiamento em geral. Nessa espécie contratual, assim como no empréstimo bancário, o cliente adquire certa quantia em dinheiro com a instituição financeira, comprometendo-se a saldá-la em determinado prazo, na forma avençada no contrato. A diferença entre eles é que, no contrato de financiamento, há destinação específica dos recursos tomados, como, por exemplo, para a aquisição de um bem imóvel ou de um veículo. Ademais, geralmente o contrato de financiamento possui algum tipo de garantia, como a hipoteca ou a alienação fiduciária. Conclui-se, então, que, na hipótese de contrato de financiamento, assim como no de mútuo, não há, para o tomador do financiamento, interesse de agir na propositura de ação de prestação de contas, uma vez que o banco não administra recursos do financiado: trata-se aqui de contrato fixo, em que há valor e taxa de juros definidos, cabendo ao próprio financiado fazer o cálculo, pois todas as informações constam no contrato. REsp 1.293.558-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 11/3/2015, DJe 25/3/2015.
O art. 18 da Lei 7.347/1985 (LACP) – “Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais” – é aplicável à ação civil pública movida por sindicato na defesa de direitos individuais homogêneos da categoria que representa. Realmente, o STJ posicionava-se no sentido de que o cabimento de ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos se restringia àqueles direitos que evolvessem relação de consumo. Esse posicionamento, entretanto, encontra-se superado, tendo em vista o entendimento de que o art. 21 da Lei 7.347/1985, com redação dada pela Lei 8.078/1990, ampliou o alcance da ação civil pública também para a defesa de interesses e direitos individuais homogêneos não relacionados a consumidores (REsp 1.257.196-RS, Segunda Turma, DJe 24/10/2012; e AgRg nos EREsp 488.911-RS, Terceira Seção, DJe 6/12/2011). Assim, é cabível o ajuizamento de ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos não relacionados a consumidores, devendo ser reconhecida a legitimidade do sindicato recorrente para propor a presente ação em defesa de interesses individuais homogêneos da categoria que representa. Com o processamento da demanda na forma de ação civil pública, incide plenamente o art. 18 da Lei 7.347/1985. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.453.237-RS, Segunda Turma, DJe 13/6/2014; e AgRg no REsp 1.423.654-RS, Segunda Turma, DJe 18/2/2014. EREsp 1.322.166-PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 4/3/2015, DJe 23/3/2015.
Se membro do MPF, atuando no STJ, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação que tramitem originariamente perante esse Tribunal Superior, este, mesmo considerando improcedentes as razões invocadas, deverá determinar o arquivamento solicitado, sem a possibilidade de remessa para o Procurador-Geral da República, não se aplicando o art. 28 do CPP. Isso porque a jurisprudência do STJ é no sentido de que os membros do MPF atuam por delegação do Procurador-Geral da República na instância especial. Assim, em decorrência do sistema acusatório, nos casos em que o titular da ação penal se manifesta pelo arquivamento de inquérito policial ou de peças de informação, não há alternativa, senão acolher o pedido e determinar o arquivamento. Nesse passo, não há falar em aplicação do art. 28 do CPP nos procedimentos de competência originária do STJ. Precedentes citados: Rp 409-DF, Corte Especial, DJe 14/10/2011; AgRg na Sd 150-SP, Corte Especial, DJe 5/5/2008; e AgRg na NC 86-SP, Corte Especial, DJ 11/6/2001. Inq 967-DF, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 18/3/2015, DJe 30/3/2015.
Quando a situação jurídico-tributária se alinhar com ambas as hipóteses de incidência da multa do art. 44 da Lei 9.430/1996 – previstas no inciso I e no inciso II –, incidirá apenas a “multa de ofício” pela falta de recolhimento de tributo (inciso I). A multa do inciso I do art. 44 da Lei 9.430/1996 é aplicável nos casos de “totalidade ou diferença de imposto ou contribuição nos casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração e nos de declaração inexata”. Por sua vez, a multa do inciso II do mesmo diploma, entretanto, é cobrada isoladamente sobre o valor do pagamento mensal: “a) na forma do art. 8º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, que deixar de ser efetuado, ainda que não tenha sido apurado imposto a pagar na declaração de ajuste, no caso de pessoa física; e b) na forma do art. 2º desta Lei, que deixar de ser efetuado, ainda que tenha sido apurado prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa para a contribuição social sobre o lucro líquido, no ano-calendário correspondente, no caso de pessoa jurídica”. Sistematicamente, nota-se que a multa do inciso II do referido artigo somente poderá ser aplicada quando não possível a multa do inciso I. Destaca-se que o inadimplemento das antecipações mensais do imposto de renda, por exemplo, não implica, por si só, a ilação de que haverá tributo devido. Os recolhimentos mensais, ainda que configurem obrigações de pagar, não representam, no sentido técnico, o tributo em si. Este apenas será apurado ao final do ano-calendário, quando ocorrer o fato gerador. Assim, as hipóteses do inciso II, “a” e “b”, em regra, não trazem novas hipóteses de cabimento de multa. A melhor exegese revela que não são multas distintas, mas apenas formas distintas de aplicação da multa do art. 44, em consequência de, nos casos ali descritos, não haver nada a ser cobrado a título de obrigação tributária principal. As chamadas “multas isoladas”, portanto, apenas servem aos casos em que não possam ser as multas exigidas juntamente com o tributo devido (inciso I), na medida em que são elas apenas formas de exigência das multas descritas no caput. Esse entendimento é corolário da lógica do sistema normativo-tributário que pretende prevenir e sancionar o descumprimento de obrigações tributárias. De fato, a infração que se pretende repreender com a exigência isolada da multa é completamente abrangida por eventual infração que acarrete, ao final do ano-calendário, o recolhimento a menor dos tributos e que dê azo, assim, à cobrança da multa de forma conjunta. Ademais, em se tratando as multas tributárias de medidas sancionatórias, aplica-se a lógica do princípio penal da consunção, em que a infração mais grave abrange aquela menor que lhe é preparatória ou subjacente. O princípio da consunção (ou da absorção) é aplicável nos casos em que há uma sucessão de condutas típicas com existência de um nexo de dependência entre elas. Segundo esse preceito, a infração mais grave absorve aquelas de menor gravidade. Sob esse enfoque, não pode ser exigida concomitantemente a multa isolada e a multa de ofício por falta de recolhimento de tributo apurado ao final do exercício e também por falta de antecipação sob a forma estimada. Cobra-se apenas a multa de ofício pela falta de recolhimento de tributo. REsp 1.496.354-PR, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 17/3/2015, DJe 24/3/2015.
A contribuição social prevista no art. 1º da LC 110/2001 – baseada no percentual sobre o saldo de FGTS em decorrência da despedida sem justa causa –, a ser suportada pelo empregador, não se encontra revogada, mesmo diante do cumprimento da finalidade para qual a contribuição foi instituída. Inicialmente, esclareça-se que a jurisprudência do STJ tem reconhecido a atualização do saldo de FGTS (REsp 1.111.201-PE, Primeira Seção, DJe 04/03/2010, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC). De fato, a finalidade da norma era trazer novas receitas ao FGTS, visto a necessidade de promover complementação de atualização monetária a que fariam jus os trabalhadores, em decorrência dos expurgos inflacionários das contas vinculadas ao referido fundo que não foram devidamente implementadas pela Caixa Econômica Federal. Entretanto, não se pode inferir do normativo complementar que sua regência é temporária e que sua vigência extingue-se com o cumprimento da finalidade para a qual a contribuição foi instituída. Se assim o fosse, haveria expressa previsão, tal como ocorreu com outra contribuição social instituída pelo própria LC 110/2001, que estabeleceu prazo de vigência de sessenta meses, a contar de sua exigibilidade (art. 2º, § 2º). Portanto, a contribuição instituída pelo art. 1º da LC 110/2001 ainda é exigível, mormente ante o fato de que sua extinção foi objeto do Projeto de Lei Complementar 200/2012, o qual foi vetado pela Presidência da República e mantido pelo Congresso Nacional em agosto de 2013. REsp 1.487.505-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 17/3/2015, DJe 24/3/2015.
O fato de parte de um imóvel urbano ter sido declarada como Área de Preservação Permanente (APP) e, além disso, sofrer restrição administrativa consistente na proibição de construir (nota non aedificandi) não impede a incidência de IPTU sobre toda a área do imóvel. Nos termos da jurisprudência do STJ, “A restrição à utilização da propriedade referente a área de preservação permanente em parte de imóvel urbano (loteamento) não afasta a incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano, uma vez que o fato gerador da exação permanece íntegro, qual seja, a propriedade localizada na zona urbana do município. Cuida-se de um ônus a ser suportado, o que não gera o cerceamento total da disposição, utilização ou alienação da propriedade, como ocorre, por exemplo, nas desapropriações.” (REsp 1.128.981-SP, Primeira Turma, DJe 25/3/2010). O fato de parte do imóvel ser considerada como área non aedificandi (área com restrições legais ou contratuais onde não é permitido construir) não afasta o referido entendimento, pois não há perda da propriedade, mas apenas restrições de uso, a fim de viabilizar que a propriedade atenda à sua verdadeira função social. Logo, se o fato gerador do IPTU, conforme o disposto no art. 32 do CTN, é a propriedade de imóvel urbano, a simples limitação administrativa de proibição para construir não impede a sua configuração. Ademais, não há lei que preveja isenção tributária para a situação analisada, conforme a exigência dos arts. 150, § 6º, da CF e 176 do CTN. (AgRg no REsp 1.469.057-AC, Segunda Turma, DJe 20/10/2014). REsp 1.482.184-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 17/3/2015, DJe 24/3/2015.
Ante o abandono do adotando pelo pai biológico e o estabelecimento de relação paterno-filial (vínculo afetivo) entre adotante e adotando, a adoção de pessoa maior de idade não pode ser refutada sem apresentação de justa causa por parte do pai biológico. Após a revogação do art. 1.621 do CC pela Lei 12.010/2009, o ECA passou a reger, no que couber, a adoção de maiores de dezoito anos (art. 1.619 do CC). Nesse passo, convém esclarecer que o caput do art. 45 do referido Estatuto dispõe que “a adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando”. Por sua vez, o § 1° do mencionado dispositivo do ECA preceitua que “o consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar”. Ciente disso, importa destacar que o poder familiar extingue-se pela maioridade (art. 1.635 do CC), pois “os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores” (art. 1.630 do CC). Portanto, considerando-se que o direito em discussão está envolto à defesa de interesse individual e disponível de pessoa plenamente capaz e que o exercício da autonomia da vontade do maior de dezoito anos não depende mais do consentimento de seus pais ou de seu representante legal, não se aplica o art. 45 do ECA à adoção de maior de idade. Além disso, o art. 48 do ECA dispõe que “o adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos”. Desse modo, sendo possível ao filho maior buscar suas origens biológicas, partindo-se de uma interpretação teleológica desse dispositivo, é possível reconhecer também o direito de afastá-las por definitivo, por meio de adoção quando ele atingir a maioridade. REsp 1.444.747-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 17/3/2015, DJe 23/3/2015.
Na hipótese em que tenham sido publicadas, em um blog, ofensas à honra de alguém, incumbe ao ofendido que pleiteia judicialmente a identificação e rastreamento dos autores das referidas ofensas – e não ao provedor de hospedagem do blog – a indicação específica dos URLs das páginas onde se encontram as mensagens. Os blogs são páginas na internet cuja estrutura possibilita a rápida e constante atualização mediante acréscimo dos denominados posts (comentários, artigos). Essas páginas são hospedadas por provedores, que não exercem controle sobre os conteúdos das páginas criadas e operadas pelos usuários. A esses provedores de hospedagem compete garantir o sigilo, a segurança e a inviolabilidade dos dados cadastrais dos usuários, bem como o funcionamento e manutenção das páginas na internet que contenham os blogs desses usuários. Não cabe ao provedor de hospedagem localizar os artigos ofensivos à honra do ofendido, fazer juízo prévio para fornecer-lhe os dados requeridos, tais como IPs e outros. Cabe ao interessado informar o respectivo URL (Universal Resource Locator, isto é, localizador universal de recursos) em que se encontram os artigos/posts cujo conteúdo se considera lesivo. Sem essa individualização, a providência do provedor se assemelharia a um rastreamento, ficando ao seu arbítrio o apontamento de interesses exclusivos do ofendido, podendo, inclusive, envolver terceiras pessoas com quem não tem relação alguma ou que não sejam responsáveis pelo que pretende o ofendido. É certo que a Constituição Federal, ao assegurar o direito à liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, IV), vedou o anonimato. Em razão disso, deve o provedor manter dados indispensáveis à identificação dos usuários. Isso decorre, inclusive, das disposições do art. 6º, III, do CDC, que instituiu o dever de informação nas relações de consumo. Observe-se, porém, que isso se aplica aos usuários que contrataram os serviços do provedor. Dessa forma, já que a CF veda o anonimato, os provedores de hospedagem de blogs têm de manter um sistema de identificação de usuários; todavia, não estão obrigados a exercer controle do conteúdo dos posts inseridos nos blogs. Deve o ofendido, portanto, realizar a indicação específica dos URLs das páginas onde se encontra a mensagem considerada ofensiva, sem os quais não é possível ao provedor de hospedagem de blogs localizar, com segurança, determinada mensagem considerada ofensiva. REsp 1.274.971-RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 19/3/2015, DJe 26/3/2015.
A sociedade empresária gestora de portal de notícias que disponibilize campo destinado a comentários de internautas terá responsabilidade solidária por comentários, postados nesse campo, que, mesmo relacionados à matéria jornalística veiculada, sejam ofensivos a terceiro e que tenham ocorrido antes da entrada em vigor do marco civil da internet (Lei 12.965/2014). Inicialmente, cumpre registrar que, de acordo com a classificação dos provedores de serviços na internet apresentada pela Min. Nancy Andrighi no REsp 1.381.610-RS, essa sociedade se enquadra nas categorias: provedora de informação – que produz as informações divulgadas na Internet –, no que tange à matéria jornalística divulgada no site; e provedora de conteúdo – que disponibiliza na rede as informações criadas ou desenvolvidas pelos provedores de informação –, no que tocante às postagens dos usuários. Essa classificação é importante porque tem reflexos diretos na responsabilidade civil do provedor. De fato, a doutrina e a jurisprudência do STJ têm se manifestado pela ausência de responsabilidade dos provedores de conteúdo pelas mensagens postadas diretamente pelos usuários (REsp 1.338.214-MT, Terceira Turma, DJe 2/12/2013) e, de outra parte, pela responsabilidade dos provedores de informação pelas matérias por ele divulgadas (REsp 1.381.610-RS, Terceira Turma, DJe 12/9/2013). Não obstante o entendimento doutrinário e jurisprudencial contrário à responsabilização dos provedores de conteúdo pelas mensagens postadas pelos usuários, o caso em análise traz a particularidade de o provedor ser um portal de notícias, ou seja, uma sociedade cuja atividade é precisamente o fornecimento de informações a um vasto público consumidor. Essa particularidade diferencia o presente caso daqueles outros julgados pelo STJ, em que o provedor de conteúdo era empresa da área da informática, como a Google, a Microsoft etc. Efetivamente, não seria razoável exigir que empresas de informática controlassem o conteúdo das postagens efetuadas pelos usuários de seus serviços ou aplicativos. Todavia, tratando-se de uma sociedade que desenvolve atividade jornalística, o controle do potencial ofensivo dos comentários não apenas é viável, como necessário, por ser atividade inerente ao objeto da empresa. Ademais, é fato notório, nos dias de hoje, que as redes sociais contêm um verdadeiro inconsciente coletivo que faz com que as pessoas escrevam mensagens, sem a necessária reflexão prévia, falando coisas que normalmente não diriam. Isso exige um controle por parte de quem é profissional da área de comunicação, que tem o dever de zelar para que o direito de crítica não ultrapasse o limite legal consistente no respeito à honra, à privacidade e à intimidade da pessoa criticada. Assim, a ausência de qualquer controle, prévio ou posterior, configura defeito do serviço, uma vez que se trata de relação de consumo. Ressalte-se que o ponto nodal não é apenas a efetiva existência de controle editorial, mas a viabilidade de ele ser exercido. Consequentemente, a sociedade deve responder solidariamente pelos danos causados à vítima das ofensas morais, que, em última análise, é um bystander, por força do disposto no art. 17 do CDC. Saliente-se que, tratando-se de uma sociedade que desenvolva atividade jornalística, não se pode admitir a ausência de qualquer controle sobre as mensagens e comentários divulgados, porque se mesclam com a própria informação, que é o objeto central da sua atividade econômica, devendo oferecer a segurança que dela legitimamente se espera (art. 14, § 1º, do CDC). Cabe esclarecer que o marco civil da internet (Lei 12.965/2014) não se aplica à hipótese em apreço, porque os fatos ocorreram antes da entrada em vigor dessa lei, além de não se tratar da responsabilidade dos provedores de conteúdo. Consigne-se, finalmente, que a matéria poderia também ter sido analisada na perspectiva do art. 927, parágrafo único, do CC, que estatuiu uma cláusula geral de responsabilidade objetiva pelo risco, chegando-se a solução semelhante à alcançada mediante a utilização do CDC. REsp 1.352.053-AL, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/3/2015, DJe 30/3/2015.
Não se deve desconstituir a penhora de imóvel sob o argumento de se tratar de bem de família na hipótese em que, mediante acordo homologado judicialmente, o executado tenha pactuado com o exequente a prorrogação do prazo para pagamento e a redução do valor de dívida que contraíra em benefício da família, oferecendo o imóvel em garantia e renunciando expressamente ao oferecimento de qualquer defesa, de modo que, descumprido o acordo, a execução prosseguiria com a avaliação e praça do imóvel. De fato, a jurisprudência do STJ inclinou-se no sentido de que o bem de família é impenhorável, mesmo quando indicado à constrição pelo devedor. No entanto, o caso em exame apresenta certas peculiaridades que torna válida a renúncia. Com efeito, no caso em análise, o executado agiu em descompasso com o princípio nemo venire contra factum proprium, adotando comportamento contraditório, num momento ofertando o bem à penhora e, no instante seguinte, arguindo a impenhorabilidade do mesmo bem, o que evidencia a ausência de boa-fé. Essa conduta antiética deve ser coibida, sob pena de desprestígio do próprio Poder Judiciário, que validou o acordo celebrado. Se, por um lado, é verdade que a Lei 8.009/1990 veio para proteger o núcleo familiar, resguardando-lhe a moradia, não é menos correto afirmar que aquele diploma legal não pretendeu estimular o comportamento dissimulado. Como se trata de acordo judicial celebrado nos próprios autos da execução, a garantia somente podia ser constituída mediante formalização de penhora incidente sobre o bem. Nada impedia, no entanto, que houvesse a celebração do pacto por escritura pública, com a constituição de hipoteca sobre o imóvel e posterior juntada aos autos com vistas à homologação judicial. Se tivesse ocorrido dessa forma, seria plenamente válida a penhora sobre o bem em razão da exceção à impenhorabilidade prevista no inciso V do art. 3º da Lei 8.009/1990, não existindo, portanto, nenhuma diferença substancial entre um ato e outro no que interessa às partes. Acrescente-se, finalmente, que a decisão homologatória do acordo tornou preclusa a discussão da matéria, de forma que o mero inconformismo do devedor contra uma das cláusulas pactuadas, manifestado tempos depois, quando já novamente inadimplentes, não tem força suficiente para tornar ineficaz a avença. Dessa forma, não se pode permitir, em razão da boa-fé que deve reger as relações jurídicas, a desconstituição da penhora, sob pena de desprestígio do próprio Poder Judiciário. REsp 1.461.301-MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 5/3/2015, DJe 23/3/2015.
No caso de dissolução parcial de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, prevalecerá, para a apuração dos haveres do sócio retirante, o critério previsto no contrato social se o sócio retirante concordar com o resultado obtido, mas, não concordando, aplicar-se-á o critério do balanço de determinação, podendo-se utilizar conjuntamente a metodologia do fluxo de caixa descontado para se aferir, inclusive, o patrimônio intangível da sociedade. No RE 89.464-SP (Segunda Turma, DJ 4/5/1979), acerca da apuração de haveres decorrente de dissolução parcial, a Suprema Corte desenvolveu o raciocínio de que se deveria conceber uma forma de liquidação que assegurasse, concomitantemente, a preservação do empreendimento e uma situação de igualdade entre os sócios. Em respeito a essa premissa, mesmo que o contrato social eleja critério para a apuração de haveres, esse somente prevalecerá caso haja a concordância das partes com o resultado alcançado. Em outras palavras, se o sócio retirante não concordar com o resultado obtido pela aplicação do critério de apuração de haveres previsto no contrato social, facultar-se-á a ele a adoção da via judicial, a fim de que seja determinada a melhor metodologia de liquidação. Nesse mesmo julgado (RE 89.464-SP), o STF decidiu que “deve ser assegurada ao sócio retirante situação de igualdade na apuração de haveres, fazendo-se esta com a maior amplitude possível, com a exata verificação, física e contábil, dos valores do ativo”. Ademais, a doutrina, ao comentá-lo, observa que o voto condutor se baseou no fato de que a saída do dissidente “não poderia lhe acarretar resultado patrimonial pior do que se fosse promovida a dissolução total”. O STJ, ao assumir o papel uniformizador da legislação infraconstitucional, ratificou esse entendimento, fixando que, “na dissolução de sociedade de responsabilidade limitada, a apuração de haveres [...] há de fazer-se como se dissolução total se tratasse”, salientando que a medida “tem por escopo preservar o quantum devido ao sócio retirante [...], evitando-se o locupletamento indevido da sociedade ou sócios remanescentes em detrimento dos retirantes” (REsp 35.702-SP, Terceira Turma, DJ 13/12/1993). Entendimento que, aliás, prevaleceu em outros julgados do STJ (REsp 89.519-ES, Terceira Turma, DJ 4/8/1997; REsp 105.667-SC, Quarta Turma, DJ 6/11/2000; e REsp 197.303-SP, Quarta Turma, DJ 15/4/2002). Nesse contexto, a Terceira Turma do STJ, há tempos (REsp 24.554-SP, DJ 16/11/1992, e 35.702-SP, DJ 13/12/1993), já decidiu que o melhor critério de liquidação de haveres a ser utilizado seria o chamado balanço de determinação, que refletiria o valor patrimonial real da empresa. Melhor explicando, o valor patrimonial é obtido dividindo-se o patrimônio líquido da sociedade pelo número de quotas. O valor do patrimônio líquido, por sua vez, irá variar conforme o critério adotado para elaboração do balanço. Por isso, na dissolução parcial, deve-se utilizar um levantamento do balanço que confira ao patrimônio líquido – e, por conseguinte, ao valor patrimonial – um valor real. Esse balanço, de acordo com os referidos precedentes, seria justamente o balanço de determinação. O balanço de determinação utiliza um critério diferenciado de avaliação do ativo, que permite uma apuração fidedigna do patrimônio líquido, baseia-se no valor de mercado, correspondendo a uma simulação da realização de todos os bens do ativo e da satisfação do passivo social, com vistas a apurar qual seria o acervo líquido da sociedade se ela estivesse sendo totalmente dissolvida naquela data. Na dissolução parcial, a equiparação à dissolução total – para efeitos da apuração de haveres – constitui mera ficção legal, não se podendo olvidar que a sociedade irá, na prática, continuar em atividade, portanto, beneficiando-se de seus bens intangíveis, cujo valor, naquele momento (de apuração de haveres), deve estar espelhado também nas cotas do sócio dissidente, que até então contribuiu para que formação desse patrimônio intangível. Acrescente-se, por oportuno, que, embora a jurisprudência consolidada mencione que a apuração de haveres há de ser feita como se tratasse de dissolução total (que se realiza mediante balanço de liquidação, portanto com exclusão dos bens intangíveis), os próprios precedentes estabelecem a utilização do balanço determinado, em que o patrimônio intangível é levado em consideração. Essa aparente contradição se resolve pela mitigação da regra de equiparação da dissolução parcial à total, lembrando que ela constitui uma ficção legal – já que a sociedade se manterá em plena atividade –, bem como que os precedentes que lhe deram origem, desde os seus primórdios (ainda no âmbito do STF), basearam-se no fato de que “deve ser assegurada ao sócio retirante situação de igualdade na apuração de haveres, fazendo-se esta com a maior amplitude possível, com a exata verificação, física e contábil, dos valores do ativo” (RE 89.464-SP). E não se diga que esse temperamento estaria desvirtuando a regra, pois a exegese do comando jurisprudencial de igualdade entre os sócios e de ampla avaliação de todo o ativo evidencia ser impossível dar-lhe cumprimento sem incluir no cálculo dos haveres do dissidente o patrimônio intangível da empresa. Quanto à metodologia a ser usada para a precificação dos haveres do sócio retirante, tem-se que a metodologia do fluxo de caixa descontado que inclua, em seu cálculo, o patrimônio intangível da sociedade representa a que melhor revela a situação econômica e a capacidade de geração de riqueza de uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Esse modelo avaliatório objetiva, em última análise, estabelecer o preço de mercado da sociedade, ou seja, o valor patrimonial real da empresa. Por isso, essa metodologia é rotineiramente utilizada em operações de aquisição, fusão e incorporação de participações societárias. Trata-se, entretanto, de um método subjetivo, inexistindo regra ou consenso sobre quais variáveis devem obrigatoriamente compor o cálculo. Seja como for, no cálculo do fluxo de caixa descontado, tem-se por praxe a inclusão do patrimônio intangível da sociedade, que corporifica uma expectativa futura de capacidade de geração de caixa ou de excesso de valor do negócio. Dessa forma, conclui-se que a utilização da metodologia do fluxo de caixa descontado vai ao encontro da jurisprudência do STJ, no sentido de que a apuração de haveres na dissolução parcial de sociedade limitada seja realizada mediante cálculo que aponte o valor patrimonial real da sociedade empresária. Nessa conjuntura, a própria orientação do STJ, de que a apuração de haveres se dê por balanço de determinação – que, repise-se, compreende os bens intangíveis da sociedade – sinaliza a possibilidade de utilização do fluxo de caixa descontado. Tanto é assim que, no julgamento do REsp 968.317-RS (DJe 11/5/2009), a Quarta Turma do STJ decidiu que “não configura ofensa ao art. 1.031 do CC/02 o acolhimento das conclusões do laudo pericial que, ao apurar o valor do fundo de comércio, utiliza-se de sistemática de cálculo consistente na projeção da rentabilidade futura trazida ao valor presente, de modo a aferir os efeitos provocados pela perda da parcela intangível do patrimônio (contas de clientes)”. Não se ignora o fato de que, ao se desligar da sociedade, o dissidente perde a condição de sócio, não mais se sujeitando aos riscos do negócio, ou seja, deixando de participar de eventuais lucros ou prejuízos apurados. Todavia, também não se pode ignorar que a saída do dissidente ontologicamente não difere da alienação de sua participação societária. Também na dissolução parcial há alienação de quotas sociais. A única diferença é que a adquirente é a própria sociedade (ou os sócios remanescentes). Portanto, se, na alienação de participação societária, aceita-se de forma pacífica que o valor de mercado das quotas seja apurado mediante aplicação da metodologia do fluxo de caixa descontado, não se vislumbra motivo para que esse mesmo método não seja utilizado na apuração de haveres de sócio retirante. Afinal, não há como reembolsar de forma digna e justa o sócio dissidente sem incluir na apuração de haveres a mais valia da empresa no mercado. Ressalte-se, por fim, que o cálculo do fluxo de caixa descontado apresenta resultados futuros trazidos a valor presente, mediante aplicação de uma taxa de desconto que contempla o custo de oportunidade do capital empregado na remuneração das quotas sociais. Dessa forma, sofrendo a mais valia futura redução a um valor presente, com base em um fator de risco, não se pode falar a rigor em participação do sócio dissidente nos lucros futuros da empresa. REsp 1.335.619-SP, Rel. originária e voto vencedor Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 3/3/2015, DJe 27/3/2015.
O falido tem capacidade para propor ação rescisória para desconstituir a sentença transitada em julgado que decretou a sua falência. Com a decretação da falência, o falido sofre uma capitis diminutio referente aos direitos patrimoniais envolvidos na falência, sendo afastado da administração dos seus bens. Sendo assim, num processo em que se discuta, por exemplo, a venda desses bens, o falido apenas poderia acompanhá-lo como assistente. Ele não poderia, portanto, tomar a iniciativa das ações com relação a bens da massa. Entretanto, no caso em que se pretenda rescindir decisão que decreta falência, a situação é diferente. Nesse caso, nem a massa nem os credores têm interesse na desconstituição da decretação de falência. Realmente, o falido é o único interessado. Por isso, se a legitimidade deste para propor a rescisão do decreto falimentar fosse retirada, ele ficaria eternamente falido, ainda que injustamente, ainda que contrariamente à ordem legal. Com efeito, a decisão que decreta a falência, conquanto acarrete ao falido uma capitis diminutio em relação aos seus bens, não o torna incapaz, de sorte que ele mantém a legitimidade para a propositura de ações pessoais. Ora, dizer que o falido não pode propor ação rescisória contra o decreto falencial é dar uma extensão que a lei não deu. Desse modo, ele tem todos os poderes processuais e todos os poderes como sujeito de direito para tentar reverter o referido decreto falimentar. REsp 1.126.521-MT, Rel. originário Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 17/3/2015, DJe 26/3/2015.
Na ação de divórcio direto consensual, é possível a imediata homologação do divórcio, sendo dispensável a realização de audiência de conciliação ou ratificação (art. 1.122 do CPC), quando o magistrado tiver condições de aferir a firme disposição dos cônjuges em se divorciarem, bem como de atestar que as demais formalidades foram atendidas. Com a edição da EC 66/2010, a nova redação do art. 226, § 6º, da CF – que dispõe que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio – eliminou os prazos à concessão do divórcio e afastou a necessidade de arguição de culpa, presente na separação, não mais adentrando nas causas do fim da união, deixando de expor desnecessária e vexatoriamente a intimidade do casal, persistindo essa questão apenas na esfera patrimonial quando da quantificação dos alimentos. Criou-se, dessa forma, nova figura totalmente dissociada do divórcio anterior. Assim, os arts. 40, § 2º, da Lei 6.515/1977 (Lei do divórcio) e 1.122, §§ 1º e 2º, do CPC, ao exigirem uma audiência a fim de se conceder o divórcio direto consensual, passaram a ter redação conflitante com o novo entendimento, segundo o qual não mais existem as condições pré-existentes ao divórcio: de averiguação dos motivos e do transcurso de tempo. Isso porque, consoante a nova redação, o divórcio passou a ser efetivamente direto. A novel figura passa ser voltada para o futuro. Passa a ter vez no Direito de Família a figura da intervenção mínima do Estado, como deve ser. Vale relembrar que, na ação de divórcio consensual direto, não há causa de pedir, inexiste necessidade de os autores declinarem o fundamento do pedido, cuidando-se de simples exercício de um direito potestativo. Portanto, em que pese a determinação constante no art. 1.122 do CPC, não mais subsiste o referido artigo no caso em que o magistrado tiver condições de aferir a firme disposição dos cônjuges em se divorciarem, bem como de atestar que as demais formalidades foram atendidas. Com efeito, o art. 1.122 do CPC cuida obrigatoriamente da audiência em caso de separação e posterior divórcio. Assim, não havendo mais a separação, mas o divórcio consensual direto e, principalmente, em razão de não mais haver que se apurarem as causas da separação para fins de divórcio, não cabe a audiência de conciliação ou ratificação, por se tornar letra morta. Nessa perspectiva, a audiência de conciliação ou ratificação teria apenas cunho eminentemente formal, sem nada a produzir. De fato, não se desconhece que a Lei do Divórcio ainda permanece em vigor, discorrendo acerca de procedimentos da separação judicial e do divórcio (arts. 34 a 37, 40, §2º, e 47 e 48), a qual remete ao CPC (arts. 1.120 a 1.124). Entretanto, a interpretação de todos esses dispositivos infraconstitucionais deverá observar a nova ordem constitucional e a ela se adequar, seja por meio de declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, seja como da interpretação conforme a constituição ou, como no caso em comento, pela interpretação sistemática dos artigos. REsp 1.483.841-RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 17/3/2015, DJe 27/3/2015.
Não se exige o recolhimento de custas iniciais para oferecer embargos à ação monitória. Isso porque, conforme se verifica dos precedentes que deram origem à Súmula 292 do STJ (“A reconvenção é cabível na ação monitória, após a conversão do procedimento em ordinário”), os embargos à monitória tem natureza jurídica de defesa. REsp 1.265.509-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 19/3/2015, DJe 27/3/2015.
O antigo proprietário – alienante – tem legitimidade para cobrar os aluguéis que tenham vencido em data anterior à alienação do imóvel, somente cabendo ao novo proprietário – adquirente – direito sobre tais parcelas caso disposto no contrato de compra e venda do imóvel. Em princípio, o contrato de locação é uma relação jurídica de cunho obrigacional, pessoal, constituída entre o locador e o locatário, em que o primeiro transfere ao segundo a posse direta do imóvel para uso. Já o contrato de compra e venda celebrado posteriormente entre o proprietário/locador e terceiro estabelece um novo negócio jurídico, que não vincula, por si só, o adquirente do imóvel ao locatário, tendo em vista que não foi ele quem contratou a locação, e sim o locador/vendedor, que deixou de ser proprietário da coisa. Ademais, a alienação não altera a relação obrigacional entre o locatário e o locador no período anterior à venda do imóvel. Sendo assim, o locatário se tornará obrigado perante o novo proprietário somente após o negócio jurídico, por força de sub-rogação legal, nos termos do art. 8º, § 2º, da Lei 8.245/1991. REsp 1.228.266-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 10/3/2015, DJe 23/3/2015.
É juridicamente possível o pedido de alimentos decorrente do rompimento de união estável homoafetiva. De início, cabe ressaltar que, no STJ e no STF, são reiterados os julgados dando conta da viabilidade jurídica de uniões estáveis formadas por companheiros do mesmo sexo sob a égide do sistema constitucional inaugurado em 1988, que tem como caros os princípios da dignidade da pessoa humana, a igualdade e repúdio à discriminação de qualquer natureza (STF: ADPF 132, Tribunal Pleno, DJe 14/10/2011; e RE 477554 AgR, Segunda Turma, DJe 26/08/2011. STJ: REsp 827.962-RS, Quarta Turma, DJe 08/08/2011; e REsp 1.199.667-MT, Terceira Turma, DJe 04/08/2011). Destaque-se que STF explicitou que o julgamento da ADPF 132-RJ proclamou que “ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual” (RE 477.554 AgR, Segunda Turma, DJe 26/8/2011). De fato, a igualdade e o tratamento isonômico supõem o direito a ser diferente, o direito a autoafirmação e a um projeto de vida independente de tradições e ortodoxias, sendo a base jurídica para a construção do direito à orientação sexual como direito personalíssimo, atributo inerente e inegável da pessoa humana. Em outras palavras, resumidamente: o direito à igualdade somente se realiza com plenitude se for garantido o direito à diferença. Conclusão diversa também não se mostra consentânea com o ordenamento constitucional, que prevê o princípio do livre planejamento familiar (§ 7º do art. 226), tendo como alicerce a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) somada à solidariedade social (art. 3º) e à igualdade substancial (arts. 3º e 5º). É importante ressaltar, ainda, que o planejamento familiar se faz presente tão logo haja a decisão de duas pessoas em se unirem, com escopo de constituírem família. Nesse momento, a Constituição lhes franqueia ampla proteção funcionalizada na dignidade de seus membros. Trilhando esse raciocínio é que o STF, no julgamento conjunto da ADPF 132-RJ e da ADI 4.277-DF, conferiu interpretação conforme ao art. 1.723 do CC (“é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”) para afastar qualquer exegese que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como “entidade familiar”, entendida esta como sinônimo perfeito de família. Por conseguinte, “este reconhecimento é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas conseqüências da união estável heteroafetiva”. Portanto, a legislação que regula a união estável deve ser interpretada de forma expansiva e igualitária, permitindo que as uniões homoafetivas tenham o mesmo regime jurídico protetivo conferido aos casais heterossexuais, trazendo efetividade e concreção aos princípios da dignidade da pessoa humana, não discriminação, igualdade, liberdade, solidariedade, autodeterminação, proteção das minorias, busca da felicidade e ao direito fundamental e personalíssimo à orientação sexual. Nessa ordem de ideias, não há como afastar da relação de pessoas do mesmo sexo a obrigação de sustento e assistência técnica, protegendo-se, em última análise, a própria sobrevivência do mais vulnerável dos parceiros, uma vez que se trata de entidade familiar, vocacionalmente amorosa, parental e protetora dos respectivos membros, constituindo-se no espaço ideal das mais duradouras, afetivas, solidárias ou espiritualizadas relações humanas de índole privada, o que a credenciaria como base da sociedade (ADI 4.277-DF e ADPF 132-RJ). Ora, se a união homoafetiva é reconhecidamente uma família e se o fundamento da existência das normas de direito de família consiste precisamente em gerar proteção jurídica ao núcleo familiar, parece despropositado concluir que o elevado instrumento jurídico dos alimentos não pudesse alcançar os casais homoafetivos, relação também edificada na solidariedade familiar, com espeque no dever de cooperação, reciprocidade e assistência mútuos (art. 1.724 do CC). De fato, o direito a alimentos do companheiro que se encontra em situação precária e de vulnerabilidade assegura a máxima efetividade do interesse prevalente, a saber, o mínimo existencial, com a preservação da dignidade do indivíduo, conferindo a satisfação de necessidade humana básica. É por isso que a doutrina afirma que a proteção das pessoas “em situação de vulnerabilidade e necessitadas de auxílio material encontra suas requisições alimentícias na solidariedade familiar, edificada na cooperação, ajuda, contribuição, reciprocidade e na assistência dos demais indivíduos que compõem o seu núcleo familiar, pois é dentro das diferentes relações de família, sejam elas de origem biológica ou advindas de vínculos afetivos hétero ou homossexuais, que seus componentes materializam seus direitos e suas expectativas pessoais”. Realmente, o projeto de vida advindo do afeto, nutrido pelo amor, solidariedade, companheirismo, sobeja obviamente no amparo material dos componentes da união, até porque os alimentos não podem ser negados a pretexto de uma preferência sexual diversa. O art. 1.694 do CC, ao prever que os parentes, os cônjuges ou companheiros podem pedir uns aos outros alimentos, na qualidade de sujeitos potencialmente ativos e passivos dessa obrigação recíproca, não exclui o casal homossexual dessa normatização. De fato, a conclusão que se extrai no cotejo de todo ordenamento é a de que a isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família (ADI 4.277-DF e ADPF 132-RJ), incluindo-se aí o reconhecimento do direito à sobrevivência com dignidade por meio do pensionamento alimentar. REsp 1.302.467-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/3/2015, DJe 25/3/2015.
O Ministério Público tem legitimidade para promover medida assecuratória que vise à garantia do pagamento de multa imposta por sentença penal condenatória. É certo que, com a edição da Lei 9.268/1996, a qual deu nova redação ao art. 51 do CP, modificou-se o procedimento de cobrança da pena de multa, passando-se a aplicar as regras referentes à Fazenda Pública. Cabe referir, por oportuno, que não obstante a pena de multa tenha passado a ser considerada dívida de valor, não perdeu sua natureza jurídica de sanção penal. Todavia, na hipótese em análise, discute-se a legitimidade do MP não para cobrança de pena de multa – esta sim de legitimidade da Fazenda Pública –, mas para promover medida assecuratória, a qual está assegurada tanto pelos termos do art. 142 do CPP quanto pela própria titularidade da ação penal, conferida pela Constituição Federal. Precedentes citados: Resp 1.115.275-PR, Quinta Turma, DJe 4/11/2011); e RMS 21.967-PR, Quinta Turma, DJe 2/3/2009. REsp 1.275.834-PR, Rel. Min. Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 17/3/2015, DJe 25/3/2015.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. Informativo 558 do STJ - 2015 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 abr 2015, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/informativos dos tribunais/44116/informativo-558-do-stj-2015. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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